Moralismo não é o Evangelho

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Por Albert Mohler Jr.
 
 
Um dos mais impressionantes enunciados feitos pelo apóstolo Paulo é a sua acusação de que os crentes da Galácia teriam abandonado o evangelho. “Estou admirado de que tão depressa estejais desertando daquele que vos chamou na graça de Cristo, para outro evangelho” [Gálatas 1.6]. Com essa declaração tão enfática, percebemos que os gálatas tinham falhado no teste crucial de discernir o verdadeiro evangelho de suas falsificações.

Suas palavras não poderiam ser mais claras “ainda que nós mesmos ou um anjo do céu vos pregasse outro evangelho além do que já vos pregamos, seja maldito. Como antes temos dito, assim agora novamente o digo: Se alguém vos pregar outro evangelho além do que já recebestes, seja maldito!” [Gálatas 1.8-9].

Essa advertência do apóstolo Paulo, expressada pelas suas palavras de espanto e tristeza, não é direcionada apenas para aquela igreja na Galácia, mas para toda congregação em todas as eras. Nos nossos próprios dias – e em nossas próprias igrejas – necessitamos desesperadamente dar ouvidos a essa advertência. Atualmente temos encontrado falsos evangelhos não menos subversivos e sedutores do que aqueles encontrados e abraçados pelos gálatas.

No nosso contexto, um dos falsos evangelhos mais sedutores é o moralismo. Esse falso evangelho pode tomar diversas formas e pode surgir no meio de qualquer intenção política e cultural. Todavia, a estrutura básica do moralismo é essa: a crença de que o Evangelho pode ser reduzido a uma boa melhora no comportamento.

Infelizmente, esse falso evangelho é particularmente atrativo àqueles que acreditam ser evangélicos motivados por um impulso bíblico. Muitos crentes e suas igrejas sucumbem à lógica do moralismo e reduzem o seu entendimento do evangelho a um melhoramento moral. Em outras palavras, nós comunicamos aos perdidos a mensagem de que Deus deseja e demanda deles que eles vivam uma vida correta.

Em certo sentido, nós nascemos para sermos moralistas. Criados à imagem de Deus, recebemos a capacidade de consciência moral. Desde os primeiros anos, nossa consciência grita revelando o conhecimento de nossa culpa, defeitos e mau comportamento. Em outras palavras, nossa consciência revela nossa iniquidade.

Acrescente a isso o fato de que o processo de educação de filhos tende a inculcar-nos moralismo desde os primeiros anos de nossas vidas. Desde cedo aprendemos que nossos pais estão preocupados com nosso comportamento. Crianças bem comportadas são recompensadas com a aprovação dos pais, enquanto mal o comportamento atrai a punição. Essa mensagem é reforçada por outras autoridades na vida dos jovens e está impregnada na sociedade.

Escrevendo sobre sua infância na área rural da Georgia, o romancista Ferrol Sams descreveu a impregnada tradição de ser “bem criado”. Como ele explica, a criança que é “bem criada” alegra seus pais e outros adultos ao aderir às convenções morais e de etiqueta. Um jovem “bem criado” se torna um adulto que obedece as leis, respeita os vizinhos, concorda, mesmo que falsamente, com os padrões religiosos e fica longe de escândalos. O ponto aqui está claro – isso é o que os pais ensinam, o que a sociedade espera e o que a igreja celebra. Mas nossa sociedade está cheia de pessoas que foram “bem criadas”, mas estão indo direto para o inferno.

A sedução do moralismo é a essência do seu poder. Nós somos facilmente seduzidos a acreditar que somos capazes de receber a aprovação de que precisamos baseado no nosso comportamento. É claro que, para conseguirmos participar desse jogo de sedução, precisamos negociar o código moral que define o comportamento aceitável criando inúmeros furos. Muitos moralistas não vão dizer que não têm pecado, mas não estão em escândalo. E isso é considerado suficiente.

Moralistas podem ser classificados como liberais ou conservadores. Em cada caso, um número específico de preocupações morais determina a expectativa moral. Generalizando, é certo que liberais focam no conjunto de expectativas morais relacionadas com a ética social, enquanto conservadores tendem a focar na ética pessoal. Em ambos a essência do moralismo está patente- a crença de que conseguimos alcançar o padrão da justiça por meios do nosso próprio comportamento.

A tentação teológica do moralismo é tal que muitos cristãos e igrejas acham difícil resistir. O perigo é a igreja comunicar direta ou indiretamente que o que Deus espera da humanidade caída é um aperfeiçoamento moral. Fazendo assim, a igreja subverte o evangelho de Deus e passa a anunciar o falso evangelho ao mundo caído.

A Igreja de Cristo não tem outra opção, apenas pregar a Palavra de Deus e a Bíblia ensina fielmente a lei de Deus e um extenso código moral. Os cristãos entendem que Deus se revela por meio da criação de tal forma que Ele presenteou a humanidade com o poder refreador da lei. Além do mais, Ele nos presenteou com mandamentos específicos e com uma abrangente instrução moral. A fiel Igreja de Jesus Cristo deve afirmar a retidão de tais mandamentos e a graça dada a nós no conhecimento do que é bom e do que é mau. Devemos, inclusive, dar testemunho desse conhecimento do bem e do mal a nosso próximo. O poder refreador da lei é importantíssimo para a comunidade humana e para a civilização.

Assim como os pais ensinam corretamente seus filhos a obedecerem a instrução moral, a igreja também tem a responsabilidade de ensinar os seus os mandamentos morais de Deus e ser testemunha para toda a sociedade de o que Deus declarou bom e reto para suas criaturas humanas.

Esse impulso – correto e necessário – não é , todavia, o evangelho de Deus. Na verdade, um dos mais traiçoeiros falsos evangelhos é o moralismo que promete o favor de Deus e a satisfação da justiça de Deus aos pecadores se eles somente se comportarem e se comprometerem ao aperfeiçoamento moral.

O instinto moralista na igreja reduz a Bíblia a um manual para o comportamento e substitui a instrução moral pelo evangelho de Jesus Cristo. Muitos púlpitos evangélicos estão dados a mensagens moralistas e não à pregação do Evangelho.

O corretivo para o moralismo vem direto do apóstolo Paulo quando ele insiste que “o homem não é justificado pelas obras da lei, mas pela fé em Cristo Jesus”. Salvação vem àqueles que são “justificados pela fé em Cristo e não pelas obras da lei; visto que pelas obras da lei ninguém será justificado.” [Gálatas 2.16]

Nós pecamos contra Cristo e adulteramos o evangelho quando sugerimos a pecadores que o que Deus requer deles é aperfeiçoamento moral de acordo com a Lei. Moralismo faz muito sentido aos pecadores pois não passa de uma explicação do que eles já vêm aprendendo desde os primeiros dias. Mas o moralismo não é o evangelho e ele não pode salvar. O único evangelho que salva é o Evangelho de Cristo. Como Paulo lembrou aos gálatas, “mas quando chegou a plenitude dos tempos, Deus enviou seu Filho, nascido de mulher, nascido debaixo da Lei, para regatar os que estavam debaixo da Lei, a fim de recebermos a adoção de filhos.” [Gálatas 4.4-5]

Nós somos justificados pela fé somente, salvos pela graça somente e redimidos dos pecados por Cristo somente. Moralismo produz pecadores (potencialmente) melhor comportados. O Evangelho transforma pecadores em filhos e filhas adotados por Deus.

A Igreja deve nunca se esquivar, acomodar, revisar ou esconder a Lei de Deus. Na verdade, é a Lei que mostra nosso pecado e deixa clara nossa total inadequação e falta de retidão. A Lei não pode transmitir vida, mas como Paulo insiste, ela “se tornou nosso tutor para nos conduzir a Cristo, a fim de que fôssemos justificados pela fé.” [Gálatas 3.24]

O perigo mortal do moralismo tem se tornado uma constante tentação para a igreja e um sempre-conveniente substituto do Evangelho. Claramente percebemos que milhares dos nossos vizinhos pensam que o moralismo é a nossa mensagem e somente a mais ousada pregação do verdadeiro Evangelho será suficiente para corrigir essa impressão e levar pecadores à salvação em Jesus.

O inferno estará cheio de pessoas “bem criadas”. Os cidadãos do Céu serão aqueles que, pela completa graça e misericórdia de Deus, estarão lá pela justiça de Jesus Cristo creditada a eles.

Fonte: Ipródigo
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