A internet é lugar para tratar de temas polêmicos?

.

Por Rev. Alan Rennê Alexandrino Lima


A internet não é lugar para tratar de temas polêmicos! Em vez disso, por quê não tratar de assuntos que edifiquem?

A frase acima - ou variações dela - é muito comum nas redes sociais e em comentários de vídeos do YouTube. A ideia é que, em vez de tratar de assuntos polêmicos é preferível tratar de pontos pacíficos, não controversos, que agradem aos adeptos de todos os segmentos neste grande mundo que é o evangelicalismo brasileiro. Na verdade, este tipo de pensamento é um reflexo do politicamente correto que tanto tem imbecilizado a nossa sociedade. Os erros estão aí. Eles são gritantes. Aberrações são praticadas em nome de Deus - coisas como "se você crê digite 'amém'" -, mas ninguém pode dizer absolutamente nada! Por que não? Porque vai ofender a muita gente. Porque muitas pessoas vão se sentir atingidas, afinal de contas, já dizia Erasmo: "Todas as tolices, por mais grosseiras que sejam, sempre têm os seus sequazes". E são os sequazes das falsas doutrinas, das doutrinas de homens que vão se sentir atingidos e vão vociferar, "para toda a rede ouvir", que aquele que levanta as questões está perdendo a oportunidade de falar do evangelho e de tratar daquilo que edifica.

Mas, será isso mesmo? Será que expor os erros é algo que não edifica?

De fato, o apóstolo Paulo nos ensina que em tudo aquilo que fazemos devemos buscar a edificação uns dos outros:

"Assim, pois, seguimos as coisas da paz e também as da edificação de uns para com os outros" (Romanos 14:19).

"Portanto, cada um de nós agrade ao próximo no que é bom para edificação" (Romanos 15:2).

"Há muito, pensais que nos estamos desculpando convosco. Falamos em Cristo perante Deus, e tudo, ó amados, para vossa edificação" (2Coríntios 12:19).

"Não saia da vossa boca nenhuma palavra torpe, e sim unicamente a que for boa para edificação, conforme a necessidade, e, assim, transmita graça aos que ouvem" (Efésios 4:29).

A palavra "edificação", como é sabido, traz a ideia de uma construção, do levantamento de um edifício. O Thayer's Greek Lexicon diz que o uso metafórico da palavra fala "do ato de promover o crescimento de outra pessoa na sabedoria, piedade, santidade e felicidade cristã". Ora, se edificação é isso, então, gostaria de perguntar: Expor o erro e ensinar a verdade não edifica? O que mais pode edificar uma pessoa senão a verdade? É na verdade que somos santificados: "Santifica-os na verdade; a tua palavra é a verdade" (João 17.17).

Alguns podem argumentar usando o já citado texto de Romanos 14.19: "Assim, pois, seguimos as coisas da paz e também as da edificação de uns para com os outros". Eles podem dizer: "Está vendo? Precisamos seguir as coisas da paz". "Assuntos polêmicos" - assuntos que desmascaram o engano -, dizem eles, "não contribuem para o objetivo de buscarmos aquilo que é da paz!" E eu pergunto: Que paz pode existir quando o erro, a mentira, o engano, as falsas doutrinas e o falso culto permanecem encobertos e intocados? É atribuído a Lutero o seguinte dito: "A paz, se possível, mas a verdade, a qualquer preço". É isso! Não há paz real e verdadeira na mentira! O que existe é conveniência! Apenas isso! Assim, quando o apóstolo Paulo fala de buscarmos as coisas da paz, certamente, ele não tem em mente deixar o engano intocado!

Para edificar, em muitos casos, é preciso destruir a superestrutura de um edifício que está caindo aos pedaços. Chega-se ao ponto de, até mesmo, ter de mexer nos alicerces. Um alicerce ruim é prejudicial! O mesmo é verdade em relação ao nosso desejo de que os nossos irmãos cresçam na piedade, no conhecimento e na graça de nosso Senhor Jesus Cristo!

Por isso, para edificarmos uns aos outros naquilo que é agradável ao Senhor Jesus, se preciso for, marretemos com força as paredes construídas com o cimento da mentira e rebocadas com a lisonja do engano maligno!

***
Fonte: Rev. Alan Rennê via Facebook
.

Batismo no Espírito Santo: uma segunda bênção?

.

Por Paulo Ribeiro


A doutrina bíblica do batismo com ou no Espírito Santo é maravilhosa e aponta para uma realidade que sintetiza a mensagem do evangelho: a de que Deus estava em Cristo reconciliando consigo o mundo, não imputando aos homens as suas transgressões (2Co 5.19). Esta doutrina, a do batismo, mostra que Deus opera em seus eleitos a ação de purificá-los do pecado, de uma só vez, aspergindo-lhes o Espírito Santo em uma aplicação individual da obra expiatória de Cristo em favor deles. O resultado pode ser descrito conforme 1Pe 1.2: fomos eleitos...em santificação do Espírito (neste contexto, um termo equivalente à justificação)...para a aspersão do sangue de Jesus Cristo.

Porém, esta doutrina sofreu algumas reinterpretações ao longo dos últimos séculos e, em tempos mais recentes, Charles Fox Parham (1873 - 1929) efetuou uma releitura desta doutrina explicando que ela, na verdade, seria uma segunda bênção, distinta da conversão e justificação do crente. O cristão primeiro se converteria (isso mesmo: o próprio cristão SE converteria, mas deixo este problema para outro artigo) e, então, estaria unido a Cristo e perdoado. Mas, ele precisaria receber uma bênção posterior - o batismo com o Espírito - para receber poder para o testemunho, dons especiais, etc.

Para deixar a doutrina ainda mais confusa, o ramo cristão que se erigiu a partir de Parham, ramo que chamamos de "pentecostalismo", associou o que entenderam como uma segunda bênção ao anacrônico dom de línguas, dizendo que a glossolália, portanto, seria evidência do batismo no Espírito. E o texto bíblico de Atos 2 serviu como o selo de que as coisas são realmente assim. Os discípulos receberam o Espírito Santo no pentecostes; os discípulos falaram em línguas "estranhas" (volto nisso em outro artigo); logo, quem é batizado no Espírito, fala em línguas.

Entretanto, seria realmente o batismo no Espírito Santo uma bênção posterior e distinta da conversão? Quais seriam as implicações de adotarmos esta ideia? Ela teria alguma implicação para a soteriologia? E para a bibliologia? Certamente teria implicações dramáticas para a práxis cristã. Mas o mais importante aqui é: seria esta interpretação correta?

O que diz a doutrina

Frases que mencionam um certo batismo com/no/do Espírito Santo ocorrem poucas vezes no Novo Testamento (Mt 3.11; Mc 1.8; Lc 3.16; Jo 1.33; At 1.5; 11.16; 1Co 12.13), embora diversas outras passagens aludam à esta mesma operação empregando termos diferentes. Algumas vezes a sentença parece indicar que o Espírito é o agente e a igreja é o meio com o qual os crentes são batizados (frases que dizem "batismo do Espírito") e outras a sentença parece mostrar que Cristo é o agente e o Espírito é o meio com o qual as pessoas são batizadas (frases que dizem "batismo com o Espírito"). Contudo, a sadia interpretação deve considerar o princípio da analogia da fé, pelo qual determinado ensino deve ser observado segundo a totalidade da revelação bíblica, e em virtude do qual uma passagem deve lançar luz hermenêutica sobre outra.

Assim, se observarmos todas as passagens que, de alguma maneira, mencionam o batismo no/com/pelo Espírito Santo, constataremos que se trata de uma mesma e única operação divina, que ocorre concomitantemente à regeneração. E três grandes razões nos levam a afirmar isso:

(I) O texto de 1Co 12.13 diz que todos os cristãos foram batizados. Considerando o fato de que na igreja de Corinto havia cristãos em pecado e de que, segundo o ensino pentecostal, uma pessoa, para receber o batismo, precisa santificar-se muito [1], somos levados a constatar que o batismo recebido pelos coríntios não foi o batismo especial e distinto da conversão preconizado pelos pentecostais. Antes, foi a obra de Deus que regenera seus eleitos, os converte e justifica.

(II) Não há, na Escritura inteira, uma só exortação para que os crentes (os que realmente foram salvos) busquem uma bênção posterior e adicional que, supostamente, os capacitaria para o testemunho. Devemos nos perguntar se uma operação paracletológica aparentemente tão importante como esta não deveria ser alvo de constantes (ou ao menos de um!) encorajamento apostólico para que os crentes a buscassem. Se o suposto "batismo pentecostal" fosse realmente algo tão importante e necessário, não deveríamos encontrar nas epístolas alguma exortação do tipo: "Vocês, que já creem, busquem com afinco receber esta outra bênção porque vocês precisam de poder para testemunhar do evangelho!"? Mas não encontramos. Na verdade, o principal texto-base sobre o qual o pentecostalismo se apoia na formulação desta doutrina (o de Atos 2) é um texto descritivo, reconhecidamente o tipo de texto a partir do qual NÃO DEVEMOS formular doutrinas.

(III) O texto de Ef 4.5, aparentemente e quase certamente se refere ao batismo do Espírito. Se isso for certo, temos então uma declaração explícita de que não existe um batismo posterior e distinto, afinal, "há um só Senhor, uma só fé e um só batismo".

Mas e quanto às diferenças nos termos? Às vezes a Bíblia fala em batismo com o Espírito e outras vezes em batismo pelo Espírito. A isso respondemos que, caso acepções rígidas de termos devam ser uma pauta interpretativa, então deveríamos considerar como substâncias distintas os termos "coração", "alma" e "entendimento" em Mateus 22.37; porém, sabemos que esses termos não indicam substâncias diferentes, antes, todos apontam para o aspecto interior do ser humano, sua mente e afeições. Segundo Charles C. Ryrie, é "mais provável que essa frase, usada de maneira pouco frequente e aparentemente técnica, em todas as ocorrências se referisse à mesma atividade [2]". Eu apenas retiraria o "provável" da afirmação de Ryrie para dizer que CERTAMENTE essa frase, em todas as suas ocorrências, se refere à mesma coisa. O literalismo na interpretação bíblica, com efeito, tem conduzido a graves distorções doutrinárias no pensamento cristão.

Portanto, vemos que o batismo no Espírito é uma bênção comum (1Co 12.13; Ef 4.5), gratuita (1Co 2.12; Ef 2.8,9) e definitiva (2Co 1.21,22; Ef 4.30). Ele posiciona o crente no corpo místico de Cristo e o capacita para o testemunho (At 1.8; 1Co 2.4), para a edificação da igreja (1Co 12.12-20; Ef 2.22) e, gradativamente, restaura no cristão a imagem de Deus para a sua glória (2Co 3.18; Ef 4.24; Cl 3.10).

Implicações da formulação pentecostal da doutrina

Além de a interpretação pentecostal acerca do batismo no Espírito ser essencialmente falha, ela traz algumas implicações perturbadoras para a doutrina cristã.

A primeira delas seria na eclesiologia. Afirmar que existem dois batismos diferentes, um deles comum a todos os crentes e outro reservado a quem o busca com todos os critérios - empíricos - da cartilha pentecostal é pontuar uma linha divisória na única operação divina que visa a união dos que creem em um só corpo. Tendo em mente a figura do Templo de Salomão, Paulo diz:

"Assim, pois, não sois mais estrangeiros, nem forasteiros, antes sois concidadãos dos santos e membros da família de Deus, edificados sobre o fundamento dos apóstolos e dos profetas, sendo o próprio Cristo Jesus a principal pedra da esquina; no qual todo o edifício bem ajustado cresce para templo santo no Senhor, no qual também vós juntamente sois edificados para morada de Deus no Espírito" (Ef 2.19-22).

O batismo no Espírito é precisamente aquilo que nos une mutuamente como cristãos. Neste ponto, algum defensor do pentecostalismo poderia afirmar que sua doutrina não divide a igreja, pois um dos batismos coloca o crente neste corpo. Entretanto, na visão pentecostal, permanece o fato de que, neste corpo, alguns são receptáculos de uma bênção especial e posterior enquanto todos os outros, ou são carnais porque não estão buscando este batismo, ou são carnais porque o estão buscando mas não o receberam ainda por não estarem suficientemente santificados. E para piorar, os que já receberam este batismo, têm o poder para testemunhar de Cristo enquanto os outros não. Devemos ignorar que o único fundamento legítimo para o testemunho cristão é a ressurreição de nosso Senhor (1Co 15.14), e que, uma vez que quem está lendo este artigo não viu o Cristo ressurreto com os próprios olhos mas crê como se tivesse visto, não tem o poder necessário para evangelizar? Devemos estranhar o apóstolo Pedro dizendo aos seus destinatários que mesmo eles não havendo visto Cristo, eles o amavam e nele confiavam exultando com alegria indizível e cheia de glória (1Pe 1.8)? É certo que não! Mas de acordo com a perspectiva pentecostal eles ainda não receberam a "segunda bênção". Eles creem em Cristo e a ressurreição do Senhor deu novo significado às suas vidas. Mas eles ainda lhes falta algo; eles estão quase lá...!

A segunda implicação desta doutrina pentecostal se dá em uma perigosa afirmação da contemporaneidade dos dons revelatórios ou extraordinários do Espírito Santo. A doutrina pentecostal ensina que, juntamente com o batismo no Espírito, alguns dons são dados ao cristão. E também ensina que dentre esses dons bem podem estar aqueles de natureza revelatória, assim como exibidos pelos apóstolos. Eu deixarei a questão da contemporaneidade para outro artigo, mas aqui é preciso adiantar algo. Ou os dons revelatórios ainda existem e o cânon cristão não está fechado, ou nossa Bíblia está completa, a revelação especial de Deus a nós foi bem-sucedida e, assim, os dons revelatórios cessaram. As duas posições são concorrentes e não podem coexistir. Se Deus, pelo Espírito Santo, ainda fala com seu povo por novas palavras e revelações, então a Escritura não está fechada.

Certo dia, um continuísta, argumentando comigo, disse que as profecias ainda aconteciam, mas consistiam de exortações pessoais e particulares, e jamais traziam novas verdades religiosas ou doutrinais. Ele estava tentando preservar a suficiência da Escritura. Em resposta, eu disse a ele que não importava o conteúdo da profecia, mas o autor. Se é o próprio Deus quem está falando, então as palavras que estamos a ouvir são palavras de Deus. E se são palavras de Deus, então devemos acrescentá-las às nossas Bíblias, e segue-se que nossas Bíblias não estão prontas ainda.

Contudo, a Escritura parece mostrar o contrário. Entre inúmeros textos e uma teologia bem amarrada, eu destaco a passagem de 2Pe 1.3,4:

"Visto como o seu divino poder nos tem dado tudo o que diz respeito à vida e à piedade, pelo pleno conhecimento daquele que nos chamou por sua própria glória e virtude; pelas quais ele nos tem dado as suas preciosas e grandíssimas promessas, para que por elas vos torneis participantes da natureza divina, havendo escapado da corrupção, que pela concupiscência há no mundo."

Portanto, uma vez que o testemunho de Jesus Cristo é dado pela Escritura (Jo 5.39), é justo dizer que ela é suficiente para a nossa vida e, por consequência, cessaram aqueles dons revelatórios amplamente necessários no primeiro século, quando o cânon cristão não estava ainda fechado.

Finalmente, uma terceira implicação da doutrina pentecostal dos dois batismos, e talvez a mais grave delas, é de natureza soteriológica. No exato momento em que preconizarmos a necessidade de uma segunda bênção, estamos afirmando a insuficiência da obra de nosso Senhor. Observe isto: a obra de Cristo foi determinada na eternidade (Ap 13.8). Na eternidade, Deus se agradou em glorificar seu nome decretando a salvação de alguns por causa dos seus pecados. Deus quis salvar pecadores de sua própria ira escatológica e foi isso que, soberanamente, ele fez, e o fez por meio de Cristo. Isso faz com que o sacrifício de Cristo e sua glória resultante seja nada menos que o CENTRO DA MENTE E DOS PROPÓSITOS ETERNOS DE DEUS! Pela obra expiatória de Cristo um eleito seria salvo. Ele seria salvo! Isso não é pouca coisa! A magnitude da obra de Cristo e a grandeza incontornável da consequência dessa obra para o pecador que foi salvo deveria nos fazer rejeitar qualquer ensino que pregue a necessidade de algo a mais para cristão. Um pecador que foi salvo e, assim, batizado no Espírito Santo, já recebeu tudo! Não há mais nada para ele pelo simples fato de que não há nada maior a ser recebido do que o perdão de Deus e sua amizade. Justamente por isso o apóstolo Paulo foi capaz de dizer aos efésios: "Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, o qual nos abençoou com todas as bênçãos espirituais nas regiões celestes em Cristo" (Ef 1.3). Deus não apenas nos abençoou em Cristo, mas [já] abençoou com TODAS as bênçãos espirituais naquele que nos comprou para sermos seus.

Isso significa que não há uma "segunda bênção" a ser desejada pelo cristão. Que outra bênção ele poderia querer além da amizade com Deus? Dizer que fomos regenerados, mas precisamos de algo a mais é escarnecer da obra de Cristo, que foi toda suficiente. Nele recebemos todas as bênçãos espirituais. Não há outra a ser almejada.

Assim, podemos concluir que a doutrina pentecostal do batismo no Espírito como uma segunda bênção deve ser enfaticamente rejeitada. É certo que o pentecostalismo não fere nenhuma doutrina cardeal do cristianismo. É certo que há muitos pentecostais (entre os quais alguns são amigos meus) piedosos e verdadeiramente servos de Cristo. É também certo que o pentecostalismo está, gradativamente, gerando expoentes inteligentes, canais para a promoção de uma perspectiva mais saudável e cristocêntrica de sua fé [3]. Mesmo assim, a doutrina pentecostal dos dois batismos é deveras débil e, visto que trás implicações ruins para a teologia cristã, deve ser rechaçada.

__________
Notas
1. Bíblia de Estudo Pentecostal. Rio de Janeiro: CPAD, 2006. p. 1627
2. RYRIE, Charles C. Teologia Básica. São Paulo: Mundo Cristão, 2004. p. 422
3. Um destes expoentes, que alegremente menciono, é o Gutierres Fernandes Siqueira, do site Teologia Pentecostal.

***
Fonte: Teologia Expressa
Divulgação: Bereianos
.

Você sabe o que é Justificação?

.

Por Rev. Ronaldo P. Mendes


o qual foi entregue por causa das nossas transgressões e ressuscitou por causa da nossa justificação.…” (Romanos 8.30)

A Justificação “é um ato da livre graça de Deus, no qual ele perdoa todos os nossos pecados e nos aceita como justos diante dele, somente por causa da justiça de Cristo a nós imputada, e recebida somente pela fé.” (Breve Catecismo de Westminster). O pecador que, por natureza, é inimigo de Deus, sendo justificado pela fé em Cristo pode desfrutar de uma completa e perfeita paz e harmonia com Deus (cf Romanos 5.1).

É um ato de um juiz, absolvendo alguém que é acusado de crime. Mas de qual crime o homem é acusado? A resposta está em Gêneses 3 onde está o relatado a desobediência de Adão, a queda da humanidade. O homem pecou e para ser justo diante de Deus é preciso pagar um preço, esse preço Deus cobrou em seu Filho Jesus Cristo. O homem está morto em seus delitos e pecados. Assim, para que esse homem possa viver, é necessário que Deus faça algo por ele,  Deus o torna justo através da obra de Cristo (cf Rm 3.23-24). O Senhor, por sua graça, atribui ao pecador que é culpado e condenado, mas eleito em Cristo, a retidão perfeita de Deus. Ele o absolve nos méritos de Jesus de toda a culpa e castigo, e lhe dá um direito a vida eterna. Nós não temos penalidade a pagar pelo pecado, incluindo os pecados do presente, do passado e do futuro.

Aos nossos olhos parece-nos injustiça por parte do juiz. Mais é um julgamento justo, pois a sua base é a justiça de Cristo o nosso representante que obedeceu a lei que nos sujeitava e suportou o pior castigo para pagar a nossa dívida.

Justificação segundo o Antigo Testamento

No Antigo Testamento, o conceito de justiça aparece com frequência em contextos forenses ou jurídicos. Uma pessoa justa é a que foi declarada sem culpa pelo juiz. A tarefa do juiz é condenar o culpado e absolver o inocente. Deus é juiz de todos: “porque sustentas o meu direito e a minha causa; no trono te assentas e julgas retamente.” (Salmo 9.4). Segundo o Antigo testamento, justificar implica certificar que a pessoa é inocente e, depois declarar que o fato é verdadeiro, que ela cumpriu a lei.

No texto de Deuteronômio lemos: “Em havendo contenda entre alguns, e vierem a juízo, os juízes os julgarão, justificando ao justo e condenando ao culpado” (25.1). Nesse caso “justificar” significa “declarar justo” ou inocente, assim como “condenar” significa “declarar culpado”. O Antigo Testamento emprega duas diferentes formas da mesma palavra (hidsdik e tsiddek) para expressar esta idéia. Estas palavras não indicam, exceto em algumas passagens, uma mudança moral efetuada por Deus no homem, mas designam regularmente uma declaração divina com referência ao homem. Exprimem a idéia de que Deus na competência de Juiz declara o homem justo. Por isso o pensamento que expressam é muitas vezes em oposição ao da condenação (Dt. 25.1; Pv 17.15; Is. 5.23).

Justificação segundo o Novo Testamento

No Novo testamento os termos usados para justificação, no grego, são: Dikaios (justo); Dikaiosis (justificação, defesa, reclamação dum direito); Dikaioo (tratar como justo, inocentar”, “declarar justo”.).

O verbo dikaio tem o mesmo significado que o hebraico Kadoshi (santo). Não refere à retidão moral da pessoa, mas ao estado de retidão que é o resultado da decisão judicial ou legal.

Podemos encontrar esse termo nos escritos do apóstolo Paulo: “Quem intentará acusação contra os eleitos de Deus? É Deus quem os justifica” (Romanos 4.5); “sendo justificados gratuitamente, por sua graça, mediante a redenção que há em Cristo Jesus,” (Romanos 3.24). A justificação está alicerçada sobre a obediência da vida inteira de Cristo, na qual ele cumpriu os preceitos de Deus por nós, em sua morte na cruz, quando pagou a pena do julgamento divino que era contra nós.

O sentido mais comum do verbo Dikaios é de “declarar justo”, e os escritos de Paulo trazem esse significado: “Mas, ao que não trabalha, porém crê naquele que justifica o ímpio, a sua fé lhe é atribuída como justiça.” (Romanos 4.5). Aqui Paulo não quer dizer que Deus torna justo os ímpios (transformando-os inteiramente e tornando-os moralmente perfeitos), mas em reposta à fé deles. A justificação é uma declaração legal por parte de Deus: “Quem intentará acusação contra os eleitos de Deus? É Deus quem os justifica. Quem os condenará? É Cristo Jesus quem morreu ou, antes, quem ressuscitou, o qual está à direita de Deus e também intercede por nós” (Romanos 8.33-34).

Um exemplo de declaração de justificação está em Lucas 18.9-14, onde  Jesus ensinando, conta a parábola do farizeu e publicano, encontramos ali características de dois homens diante de Deus, o fariseu não foi justificado porque confiava em seus esforços, porém o publicano voltou para casa justificado, a idéia é que ele “foi feito justo” por Deus, o próprio Deus o justificou.

De acordo com o Novo Testamento, a justificação é uma ação forense ou declarativa de Deus, como a de um juiz absolvendo o acusado. E isso pode ser observado: “e, por meio dele, todo o que crê é justificado de todas as coisas das quais vós não pudestes ser justificados pela lei de Moisés.” (Atos 13.39); “Tais fostes alguns de vós; mas vós vos lavastes, mas fostes santificados, mas fostes justificados em o nome do Senhor Jesus Cristo e no Espírito do nosso Deus.” ( I Coríntios 6.11). 

Em I Coríntios 1.30 lemos: “Mas vós sois dele, em Cristo Jesus, o qual se nos tornou, da parte de Deus, sabedoria, e justiça, e santificação, e redenção,”, Jesus é “justiça” dikaiosúnê, esse é um dos benefícios que Cristo nos trouxe através de sua morte e ressurreição. A totalidade da justiça pessoal de Cristo é imputada a nós e considerada como nossa. Deus apaga as nossas transgressões, e dos nossos pecados ele não se lembra; somos feitos justiça de Deus em Jesus, que é o fim da lei para a justiça de todo aquele que crê. A aliança das obras está cumprida em Cristo, algo que jamais conseguiríamos cumprir. Aos olhos de Deus somos justos, porque somos justificados em Cristo.

Onde Adão caiu Cristo veio cumprir: “Pois assim está escrito: O primeiro homem, Adão, foi feito alma vivente. O último Adão, porém, é espírito vivificante.” (I Coríntios 15.45). Faz parte da própria essência do evangelho insistir que Deus nos declara justos não com base em nossa atual condição de justiça ou santidade, mas com base na perfeita justiça de Cristo, a qual ele considera pertencente a nós.      

O instrumento da justificação

A teologia protestante afirma que a fé é causa instrumental da justificação no sentido em que a fé é o meio pelo qual os méritos de Cristo são apropriados a nós. “A fé, assim recebendo e assim se firmando em Cristo e em sua justiça, é o único instrumento de justificação; ela, contudo, não está sozinha na pessoa justificada, mas sempre anda acompanhada de todas as demais graças salvíficas; não é uma fé morta, mas a fé que age pelo amor.” (Confissão de Fé de Westminster)
        
A Bíblia diz que não somos justificados por nossas próprias boas obras, mas pelo que é acrescentado pela fé, ou seja, a justiça de Cristo. Deus transferiu a nós a justiça de Cristo. E o apóstolo Paulo nos ensina como ocorre a justificação: “sabendo, contudo, que o homem não é justificado por obras da lei, e sim mediante a fé em Cristo Jesus, também temos crido em Cristo Jesus, para que fôssemos justificados pela fé em Cristo e não por obras da lei, pois, por obras da lei, ninguém será justificado.” (Gálatas 2.16). Paulo indica que a fé vem primeiro com o propósito de sermos justificados.

As Escrituras nunca dizem que somos justificados por causa da bondade inerente da nossa fé, como se ela tivesse mérito diante de Deus. Nunca nos permitamos pensar que nossa fé por si só merece favor de Deus. Antes, as Escrituras dizem que somos justificados “mediante” nossa fé, dando a entender que a fé é o instrumento pelo qual a justificação nos é dada, mas em nenhuma hipótese uma atividade que obtenha o favor de Deus. Ao contrário, nós somos justificados unicamente por causa dos méritos da obra de Cristo ( Romanos 4.23-25). 

Em Palavra de Deus nos mostra o motivo e o modo de justificação para o pecador: “pois todos pecaram e carecem da glória de Deus, sendo justificados gratuitamente, por sua graça, mediante a redenção que há em Cristo Jesus, a quem Deus propôs, no seu sangue, como propiciação, mediante a fé, …” (Romanos 3.23-25), aqui temos a causa instrumental da justificação do homem caído “mediante a fé”, ou  “através da fé”.

Não pensemos nós, que o termo “causa instrumental” está dizendo que justificação depende do homem, pois tudo é dom de Deus: “Porque pela graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de vós; é dom de Deus;” (Efésios 2.8).

Quando as Escrituras falam da justificação pela obediência ou pelo sangue de Cristo, a fé está subentendida; do contrário, as passagens que falam de justificação pela fé não teriam sentido. Da mesma maneira, quando falam de justificação pela fé, ficam subentendidos o sangue e a obediência, ou não teria sentido dizer “justificado por seu sangue”; “pela obediência de um só, muitos serão justificados.” O que Cristo fez e sofreu e, também, a nossa fé em Cristo são necessários para efetuar a nossa justificação.

A fé é o oposto exato em confiar em si mesmo, ela é o meio pelo qual o injusto se torna justo diante do tribunal de Deus. A fé não é a base para a justificação. Caso fosse, o homem teria mérito. O homem nunca foi salvo por obras, mas sim por fé, é o exemplo de Abraão: “Pois que diz a Escritura? Abraão creu em Deus, e isso lhe foi imputado para justiça.” (Romanos 4.3).

Em suma, por causa instrumental entendemos que a fé é o meio pelo qual o homem é justificado, mas não é a causa da justificação. Ela é um dom de Deus, sendo assim o homem não tem nenhum mérito na justificação, pois “…é Deus quem Justifica…” (Romanos 8.33).

Para concluirmos essa breve consideração sobre a justificação, é necessário lembrarmos de que é Deus o autor da justificação do homem, pois ele é injusto diante de Deus. A justificação é a declaração legal no tribunal de Deus onde ele remove a culpa do pecado do homem, pagando a sua penalidade. É um ato de um juiz, absolvendo alguém que é acusado de crime.

No Antigo Testamento, justificação tem a idéia forense ou jurídica. Uma pessoa justa é a que foi declarada sem culpa pelo juiz. É certificar que a pessoa é inocente e, depois declarar que o fato é verdadeiro, que essa pessoa cumpriu a lei. No Novo Testamento, o termo “justificar” denota “declarar justo”, assim como no Antigo Testamento, a justificação é declaração legal por parte de Deus. E isso é por meio da fé, a causa instrumental, o meio pelo qual somos justificados, mas a fé não é a causa da nossa justificação. Ela não é a base para a justificação, mais sim os méritos de Cristo: “E é evidente que, pela lei, ninguém é justificado diante de Deus, porque o justo viverá pela fé.” (Gálatas 3.11).

A Deus toda honra e glória!

_____________
Para saber mais sobre o assunto, recomendo a leitura de alguns livros:“Justificação pela fé somente” (Joel R. Beeke, John Armstrong, John Gerstner, John MacArthur, RC Sproul), “Introdução à Teologia Sistemática (Millard J. Erickson), Justificação pela graça (Charles Haddon Spurgeon), Manual de Teologia Cristã (Louis Berkhof).

***
Fonte: Solus Christus
.

Quando matar não é crime, nem pecado

.

Por Fabio Correia


Ao contrário do que muitos pensam, o 6º mandamento - "Não matarás" - não é uma tácita e absoluta proibição de matar, independentemente da situação. Ou seja, em determinados casos não é pecado matar. Em determinadas situações é até necessário e recomendável matar.

Pode parecer paradoxal, mas o principal objetivo do 6º mandamento é proteger a vida. Sem essa Lei de Deus escrita e gravada no coração do homem não sobraria ninguém pra "contar a história". Ou seja, os homens se matariam uns aos outros. A proibição é para que o cidadão, individualmente, não tire a vida do outro de forma banal, isto é, para que ele não cometa assassinato, não faça justiça com as próprias mãos e sem um julgamento justo e competente.

Matar alguém significa sempre e necessariamente ter cometido um assassinato? Evidentemente que não. Isso parece já ter ficado claro. A palavra assassinato está diretamente relacionada a crime. Matar alguém em legítima defesa, por exemplo, não é um crime, logo, não é um assassinato. Mas há outras situações em que matar não se constitui nem crime nem pecado. Numa guerra justa, por exemplo, matar o inimigo também não constitui um erro, um crime, um pecado.

Para ilustrar o título dessa postagem, utilizaremos o desfecho trágico de uma tentativa de assalto a uma farmácia, na cidade de Garanhus, no agreste Pernambucano, no dia 14/03/11. Veja no dramático vídeo abaixo [atenção, imagens fortes]:


O policial que salvou a vítima e MATOU o marginal com um tiro certeiro na cabeça cometeu um assassinato? Incorreu no pecado contra o 6º mandamento, que ordena "não matar"? Evidentemente que não. Ninguém o acusará disso, antes, pelo contrário, o policial, provavelmente, será condecorado. Ele era um legítimo representante do Estado naquele momento. Essa morte não deve ser creditada na sua conta pessoal e sim na do Estado que nada mais estava fazendo que o seu papel de "proteger" a vida de seus cidadãos.

O policial puxou o gatilho da arma, mas não cometeu nenhum crime. Nem mesmo incorreu em desobediência ao 6º mandamento. Erraria se fosse omisso e se essa omissão culminasse com o marginal tirando a vida da vítima. Isso deixa claro que nem sempre "matar é um crime ou pecado". Matar para proteger a própria vida, de uma vítima indefesa e de toda a coletividade é, inclusive, louvável.

Nesse sentido, chamamos a atenção para a legitimidade e responsabilidade do Estado em eliminar assassinos cruéis, frios e calculistas, após justo julgamento, prestigiando e protegendo a vida da coletividade. O filósofo Tomaz de Aquino costumava dizer que "assim como é justo amputar um membro do corpo que foi acometido por um câncer para salvar todo o resto, também justo é eliminar certos elementos para proteger e preservar toda a sociedade".

Por tudo isso e por entender que existe farta prova escriturística que ensina acerca da necessidade e da responsabilidade do Estado em proteger as pessoas, inclusive utilizando, se necessário, o "poder de espada", é que sou A FAVOR da implantação da PENA CAPITAL no Brasil, sem desconhecer, evidentemente, que mudanças precisariam ser feitas e, talvez, até mesmo outra constituição. Penso que é o único meio lícito de se promover e satisfazer o desejo de justiça nos casos de assassinatos com requintes de banalidade e crueldade. Matar e ficar "apenas preso", ainda que perpetuamente, definitivamente não é justiça na mesma proporção do crime praticado.

Se quiser conhecer mais o que a Bíblia ensina sobre a pena de morte, clique aqui!

***
Fonte: Filosofia Calvinista

Leia também: Pena de morte: o que a Bíblia diz?
.

Deus Absconditus ou deus "Agnósticus"?

.

Por Rev. Hélio de Oliveira Silva


O redator-chefe, Gerard Biard, defendeu a publicação da nova edição do Charlie Hebdo no domingo 18/01 afirmando que “cada vez que desenhamos a caricatura de Maomé, de profetas, de Deus, defendemos a liberdade de religião”, disse. “Deus não deve ser uma figura política ou pública, mas sim privada.” (veja aqui, acesso em 21/01/2015). Esse comentário publicado pela Folha diz respeito à destruição de duas igrejas presbiterianas brasileiras na capital do Niger no sábado, dia 17/01, como represália muçulmana à nova edição do jornal.

Há duas incoerências contraditórias nessa dupla afirmação. Primeiramente, como a sátira irônica e ácida travestida de humor pode servir na defesa do que quer que seja, especialmente a religião? O único objetivo desse tipo de humor negro é denegrir o caricaturado! Em segundo, quando foi que Deus franqueou à humanidade o direito de lhe dizer como ele deve ser conhecido e adorado? O Deus absconditus (secreto, que vê em secreto) das Escrituras não é o deus “agnósticus” (que não pode ser conhecido) do secularismo.

Deus se deu a conhecer por meio da revelação que faz de si mesmo de forma geral na criação, pois os céus proclamam a sua glória e as suas obras (Salmo 19.1) como também de forma especial e específica nas Escrituras (2 Pe 1.20,21; 2 Tm 3.14-16) e plenamente em Jesus Cristo, que é a expressão exata de seu ser (Cl 1.15,19; Hb 1.3). Nunca pertenceu ao homem a prerrogativa de escolher como e quando conhecer a Deus, Ele simplesmente veio e vem a nós para revelar-se. Só pode conhecer o Pai aquele que o Pai deixar conhecê-lo e aquele a quem o Filho o quiser revelar (Mt 11.27; Lc 10.22).

Não cabe aos cristãos defender um conhecimento privativo de Deus e nem aceitar o conceito secularizado de uma religião privada, particular e sem expressão pública. Deus se revelou para que fosse conhecido e adorado por todas as nações que precisam conhecê-lo (Sl 100.1). A adoração ao seu nome é tanto particular quanto pública, aberta ao conhecimento de todos que precisam de sua graça e receber o seu convite para nos libertar de todos os tipos de escravidão, inclusive a escravidão de nossas consciências; seja por meio da intimidação das armas ou da ridicularização impressa de nossas crenças!

Com amor, Pr. Hélio.

***
Sobre o autor: Rev. Hélio de Oliveira Silva é Bacharel em Teologia (BTh-SPBC-1990). Mestre em Teologia Histórica (STM-CPPGAJ/2004). Bacharel em Teologia (Convalidação - FAIFA/2011). Pastor em Uruaçu-GO (1991-94); Rubiataba-GO (1995-96); Goianésia-GO (1997-98); Aparecida de Goiânia-GO (1999-2001); Pastor auxiliar na Primeira Igreja Presbiteriana de Goiânia (2002-14 - C.P.Balneário Meia Ponte [2002-2007] e C.P.Jd. Goiás [2008-2010]). Pastor auxiliar na I.P.Jd. Goiás (2015...). Professor no SPBC desde 1999 onde leciona atualmente Homilética, Prática de Pregação, História do Pensamento Cristão, História da IPB, História das Missões. Membro da Assembléia da Agência Presbiteriana de Missões Transculturais (APMT/IPB - quadriênio 2010-2014) e Associação de Professores de Missões do Brasil (APMB) desde 2008. Co-autor do livro Interpretação e Pregação (Ed. Logos - 2005) e Números - O Juízo e a Graça de Deus na Peregrinação de Seu Povo (Ed. Primícias - 2012). Casado com Ednéia. Pai de Lívia Sally e Joice.

Fonte: Anunciando Todo o Desígnio de Deus
.

Notas sobre Supralapsarianismo & Infralapsarianismo

.

Por Phillip R. Johnson


Ou não tem o oleiro poder sobre o barro, para da mesma massa fazer um vaso para honra e outro para desonra?” (Romanos 9:21).

Este artigo considera quatro dos principais modos de ordenação dos elementos soteriológicos do decreto eterno de Deus — com um foco particular sobre as diferenças entre o supralapsarianismo e o infralapsarianismo. Eu resumi as diferenças no quadro comparativo abaixo. As notas explanatórias seguem logo abaixo do mesmo.

     Sumário das Visões

     Supralapsarianismo:

     1 - Eleger alguns, reprovar o restante
     2 - Criar
     3 - Permitir a queda
     4 - Providenciar salvação para os eleitos
     5 - Chamado do eleito à salvação

     Infralapsarianismo:

     1 - Criar
     2 - Permitir a queda
     3 - Eleger alguns, ignorar o restante
     4 - Providenciar salvação para os eleitos
     5 - Chamado do eleito à salvação

     Amyraldismo:

     1 - Criar
     2 - Permitir a queda
     3 - Providenciar salvação suficiente para todos
     4 - Eleger alguns, ignorar o restante
     5 - Chamado do eleito à salvação

     Arminianismo:

     1 - Criar
     2 - Permitir a queda
     3 - Providenciar salvação para todos
     4 - Chamado de todos à salvação
     5 - Eleger aqueles que creem


A distinção entre o infralapsarianismo e o supralapsarianismo tem a ver com a ordem lógica dos decretos eternos de Deus, não com o momento da eleição. Nenhum deles sugere que os eleitos foram escolhidos após Adão pecar. Deus fez Sua escolha antes da fundação do mundo (Efésios 1:4) — bem antes de Adão pecar. Tantos os infra como os supra (e até mesmo muitos arminianos) concordam sobre isto.

SUPRALAPSARIANISMO é a visão de que Deus, contemplando o homem ainda não-caído, escolheu alguns para receber a vida eterna e rejeitou todos os outros. Assim, um supralapsariano diria que o reprovado (não-eleito) — vaso de ira preparado para destruição (Romanos 9:22) — foram primeiramente ordenados para este fim, e então o meio pelo qual eles cairiam em pecado foi ordenado. Em outras palavras, o supralapsarianismo sugere que o decreto de eleição de Deus logicamente precede Seu decreto de permitir a queda de Adão — de forma que sua condenação é, antes de tudo, um ato de soberania divida, e somente secundariamente um ato de justiça divina.

O supralapsarianismo é algumas vezes, de forma errônea, considerado o mesmo que “dupla predestinação”. O próprio termo “dupla predestinação” é freqüentemente usado duma forma equivocada e ambígua. Alguns usam-no querendo dizer nada mais do que a visão de que o destino eterno, tanto do eleito como do reprovado, é determinado pelo decreto eterno de Deus. Neste sentido do termo, todo calvinista genuíno sustenta a “dupla predestinação” — e, o fato de que o destino do reprovado está eternamente determinado, é uma doutrina claramente bíblica (cf. 1 Pedro 2:8; Romanos 9:22; Judas 4). Mas mais freqüente ainda, a expressão “dupla predestinação” é empregada como um termo pejorativo para descrever a visão daqueles que sugerem que Deus é tão ativo em manter o réprobo fora do céu como Ele é em colocar os eleitos dentro dele (Há uma forma ainda mais sinistra de “dupla predestinação”, que sugere que Deus é tão ativo em manter o réprobo mau como Ele o é em manter o eleito santo).

Esta visão (de que Deus é tão ativo na reprovação do não-eleito como Ele o é na redenção do eleito) é mais propriamente chamada de “igualdade última” (cf. R.C. Sproul, Chosen by God [Eleitos de Deus], 142). Ela é realmente uma forma de hiper-calvinismo e não tem nada a ver com o verdadeiro e histórico calvinismo. Embora todos os que sustentem tal visão também sustentem o esquema supralapsariano, a visão em si mesma não é necessariamente uma ramificação do supralapsarianismo.

O supralapsarianismo é também algumas vezes, erroneamente, considerado o mesmo que hiper-calvinismo. Todos os hiper-calvinistas são supralapsarianos, embora nem todos os supralapsarianos sejam hiper-calvinistas. O supralapsarianismo é algumas vezes chamado de “high” calvinismo, e seus aderentes mais extremos tendem a rejeitar a noção de que Deus tenha algum grau de sincera boa-vontade ou significante compaixão para com os não-eleitos. Historicamente, uma minoria de calvinistas têm sustentado esta visão.

Mas, o comentário de Boettner de que “não mais que um calvinista dentre cem sustenta a visão supralapsariana”, é, sem dúvida, um exagero. E, na década passada ou aproximadamente, a visão supralapsariana parece ter ganhado popularidade.

O INFRALAPSARIANISMO (também conhecido como “sub-lapsarianismo”) sugere que o decreto de Deus permitir a queda precede logicamente Seu decreto de eleição. Assim, quando Deus escolheu o eleito e ignorou o não-eleito, Ele estava contemplando todos eles como criaturas caídas.

Estas são as duas principais visões calvinistas. No esquema supralapsariano, Deus primeiro rejeitou os réprobos, como resultado de Seu soberano beneplácito; então Ele ordenou os meios de sua condenação através da queda. Na ordem infralapsariana, os não-eleitos foi primeiramente visto como indivíduos caídos, e eles foram condenados somente por causa do seu próprio pecado. Os infralapsarianos tendem a enfatizar o fato de Deus “ignorar” os não-eleitos (preterição) em Seu decreto de eleição.

Robert Reymond, ele mesmo um supralapsariano, propõe a seguinte redefinição da visão supralapsariana:

     O Supralapsarianismo Modificado de Reymond:

     1 - Eleger alguns homens pecadores, reprovar o restante
     2 - Aplicar os benefícios redentores aos eleitos
     3 - Providenciar salvação para os eleitos
     4 - Permitir a queda
     5 - Criar

Note que, em acréscimo à re-ordenação dos decretos, a visão de Reymond deliberadamente enfatiza que no decreto de eleição e reprovação, Deus estava contemplando os homens como pecadores. Reymond escreve, “Neste esquema, diferentemente do anterior (a ordem supralapsariana clássica), Deus é representado como discriminando entre homens vistos como pecadores, e não entre homens vistos simplesmente como homens (Veja Robert Reymond, Systematic Theology of the Christian Faith [Teologia Sistemática da Fé Cristã], 489). O refinamento de Reymond evita o criticismo comumente levantado contra o supralapsarianismo — que o supralapsariano tem Deus condenado os homens à perdição antes dEle nem mesmo contemplá-los como pecadores. Mas a visão de Reymond também deixa a questão não-respondida de como e porque Deus deveria considerar todos os homens como pecadores, antes que fosse determinado que a raça humana cairia (Alguns podem até mesmo argumentar que os refinamentos de Reymond resultam numa posição que, até onde diz respeito à distinção chave, é implicitamente infralapsariana).

Todos os principais Credos Reformados, ou são explicitamente infralapsarianos, ou evitam cuidadosamente uma linguagem que favorece uma ou outra visão. Nenhum credo importante toma a posição supralapsariana (Todo este assunto foi veementemente debatido durante toda a Assembléia de Westminster. William Twisse, um ardoroso supralapsariano e presidente da Assembléia, defendeu habilmente sua visão. Mas, a Assembléia optou pela linguagem que claramente favorece a posição infralapsariana, embora sem condenar o supralapsarianismo).

“Bavinck assinalou que a apresentação supralapsariana 'não foi incorporada a nenhuma Confissão Reformada', mas que a posição infralapsariana recebeu um lugar oficial nas Confissões das igrejas” (Berkouwer, Divine Election, 259).

A discussão de Louis Berkhof das suas visões (em sua Teologia Sistemática) é útil, embora ele pareça favorecer o supralapsarianismo. Eu tomo a visão infralpasariana, como Turretin, a maioria dos teólogos de Princeton, e a maioria dos líderes do Seminário de Westminster (por exemplo, John Murray). Estes assuntos foram o cerne da controvérsia da “graça comum” na primeira metade do século XX. Herman Hoeksema e aqueles que seguiram-no tomaram uma posição supralapsariana tão rígida que eles, no final das contas, negaram o próprio conceito de graça comum.

Finalmente, veja o quadro abaixo, que compara estas visões com o Amyraldianismo (um tipo de calvinismo de quatro-pontos) e o Arminianismo. Minhas notas em cada visão (abaixo), identifica alguns dos maiores defensores de cada visão.


NOTAS SOBRE A ORDEM DOS DECRETOS
© 1994, 1997, 2000 by Phillip R. Johnson

Supralapsarianismo

† Beza sustentava esta visão. Embora freqüentemente seja dito ser ele o responsável por formular a posição supralapsariana, ele não o fez.

† Outros proponentes históricos incluem: Gomarus, Twisse, Perkins, Voetus, Witsius, and Comrie.

† Louis Berkhof parece valorizar ambas visões, mas parece tender levemente para o supralapsarianismo (Teologia Sistemática, 120-25).

† Karl Barth sentia que o supralapsarianismo estava mais próximo do certo do que o infralpasarianismo.

† A Teologia Sistemática da Fé Cristã de Robert Reymond toma a visão supralapsariana e inclui uma defesa prolongada do supralapsarianismo.

† Turretin diz que o supralapsarianismo é “mais duro e menos apropriado” do que o infralapsarianismo. Ele crê que ele “não parece concordar suficientemente com a bondade inefável [de Deus]” (Elenctic Theology, vol. 1, 418).

† Herman Hoeksema e toda a liderança das Igrejas Protestantes Reformadas (incluindo Homer Hoeksema, Herman Hanko e David Engelsma) são supralapsarianos determinados — freqüentemente argumentando, tanto implicitamente como explicitamente, que o supralapsarianismo é o único esquema logicamente consistente. Esta presunção claramente contribui para a rejeição da graça comum pelas Igrejas Protestantes Reformadas.

† De fato, os mesmos argumentos usados em favor do supralapsarianismo têm sido empregados contra a graça comum. Assim, o supralapsarianismo tem nele uma tendência que é hostil à idéia de graça comum (É um fato que, virtualmente, todos que negam “a graça comum” são supralapsarianos).

† Supralapsarianismo é a posição de todos que sustentam o tipo mais rígido de “dupla predestinação”.

† É difícil encontrar expoentes do supralapsarianismo entre os principais teólogos sistemáticos. Mas, a tendência entre alguns dos autores mais modernos pode ser para a visão supralapsariana. Berkhof era simpatizante com esta visão; Reymond a defende expressamente.

† R. A. Webb diz que o supralapsarianismo é “abominável à metafísica, à ética e às Escrituras. Ele não é exposto em nenhum credo calvinista e pode ser defendido somente por alguns extremistas” (Salvação Cristã, 16). Embora seja simpatizante das convicções infralapsarianas de Webb, penso que ele exagera grosseiramente o julgamento contra o supralapsarianismo [Webb foi um presbiteriano do século XIX].

Infralapsarianismo

† Esta visão é também chamada “sub-lapsarianismo”.

† John Calvino disse algumas coisas que parecem indicar que tinha simpatia com esta visão, embora o debate não tenha ocorrido nos seus dias de vida (veja Calvinismo de Calvino, traduzido para o inglês por Henry Cole, 89ss; também William Cunningham, Os Reformadores e a Teologia da Reforma, 364ss).

† W. G. T. Shedd, Charles Hodge, L. Boettner, e Anthony Hoekema sustentavam esta visão.

† Tanto R. L. Dabney como William Cunningham apoiaram-se decididamente a esta visão, mas resistiram argumentar sobre o assunto. Eles criam que todo o debate ia além das Escrituras e, portanto, era desnecessário. Dabney, por exemplo, diz “Esta é uma questão que nunca deve ser levantada” (Teologia Sistemática, 233). Twisse, o supralapsariano, virtualmente concordava com isto. Ele chamava a diferença de “mera apex logicus, um ponto de lógica. E, não é mera loucura fazer uma brecha de unidade ou caridade na igreja, meramente por causa de um ponto de lógica?” (citado em Cunningham, Os Reformadores, 363). G.C. Berkouwer também concorda: “Somos confrontados aqui com uma controvérsia que deve sua existência à infração dos limites colocados pela revelação”. Berkouwer pergunta em voz alta se estamos “obedecendo o ensino da Escritura se recusamos fazer uma escolha aqui” (Eleição Divina, 254-55).

† Thornwell não concorda que o assunto seja controvertido. Ele diz que o assunto “envolve algo mais do que uma questão de método lógico. Ele é realmente uma questão da mais alta significância moral...Condenação e enforcamento são partes do mesmo processo, mas ela é algo mais do que uma questão de disposição, se um homem deve ser enforcado antes de ser condenado” (Escritos Selecionados, 2:20). Thornwell é veementemente infralapsariano.

† O infralapsarianismo foi afirmado pelo sínodo de Dort, mas somente de maneira implícita nos símbolos de Westminster. Twisse, um supralapsariano, foi o primeiro presidente da Assembléia de Westminster, que evidentemente decidiu que a conduta mais sábia era ignonar a controvérsia totalmente (embora as tendências de Westminster fossem, argumentavelmente, infralapsarianas). A Confissão de Westminster, portanto, juntamente com a maioria dos Credos Reformados, implicitamente afirmou o que o Sínodo de Utrecht (1905) mais tarde declarou explicitamente: “Que nossas confissões, certamente com respeito à doutrina da eleição, seguem a apresentação infralapsariana, [mas] isto não implica de forma alguma, uma exclusão ou condenação da apresentação supralapsariana”.

Amyraldism

Amyraldismo (é a ortografia preferida, e não AmyraldIANismo).

† Amyraldismo é a doutrina formulada por Moisés Amyraut, um teólogo francês da escola Saumur (Esta mesma escola gerou outro desvio agravante da ortodoxia reformada: a visão de Placaeus envolvendo a imputação mediata da culpa de Adão).

† Por fazer o decreto para expiar o pecado logicamente antecedente ao decreto de eleição, Amyraut podia ver a expiação como hipoteticamente universal, mas eficaz para os eleitos somente. Portanto, a visão é algumas vezes chamada de “universalismo hipotético”.

† O puritano Richard Baxter abraçou esta visão, ou algo próxima à ela. Ele parece ter sido o único líder puritano importante que não era um calvinista “completo”. Alguns discutiriam se Baxter era um verdadeiro Amyraldiano (ver, por exemplo, George Smeaton, A Doutrina Apostólica da Expiação [Edinburgh: Banner of Truth, 1991 reprint], Appendix, 542.) Mas o próprio Baxter parecia se considera um Amyraldiano.

† Esta é uma forma sofisticada de formular o “calvinismo de quatro-pontos”, enquanto ainda se considera um decreto eterno de eleição.

† Mas, o Amyraldismo provavelmente não deveria ser igualado totalmente com o assim chamado “calvinismo de quatro-pontos”. Em minha própria experiência, muitos pretensos “quatro-pontos” são incapazes de articular qualquer explicação coerentes de como a expiação pode ser universal, mas a eleição incondicional. Assim, eu não desejo glorificar a posição deles, denominando-a de Amyraldismo (Quem dera eles fossem tão comprometidos com a doutrina da soberania divina como Moisés Amyraut era! A maioria dos que se chamam “quatro-pontos” são realmente cripto-arminianos).

† A. H.Strong sustentava esta visão (Teologia Sistemática, 778). Ele a chamou (incorretamente) de “sub-lapsarianismo”.

† Henry Thiessen, evidentemente seguindo Strong, também rotulou indevidamente esta visão de “sub-lapsarianismo” (e contrastando-o com o “infralapsarianismo”) na edição original de suas Lições em Teologia Sistemática (343). Sua discussão nesta edição é muito confusa e patentemente errônea em alguns pontos. Nas edições posteriores de seu livro, esta seção foi completamente reescrita.

Arminianism

† Henry Thiessen argumento esta visão na edição original de sua Teologia Sistemática. A edição revista não mais defende explicitamente esta ordem dos decretos, mas o arminianismo fundamental de Thiessen ainda é claramente evidente.

† A maioria dos teólogos arminianos recusa tratar do decreto eterno de Deus, e arminianos extremos até negam o próprio conceito de um decreto eterno. Aqueles que reconhecem o decreto divino, contudo, devem parar de fazer a eleição contingente à resposta do crente ao chamado do evangelho. Deveras, esta é toda a essência do arminianismo.

***
Fonte: Spurgeon.org
Traduzido por: Felipe Sabino de Araújo Neto. Cuiabá-MT, 28 de Dezembro de 2004.
Via: monergismo
.