Olavo, os protestantes e a falta de filtros: que nos sirva de lição!

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Quem é meu amigo ou me acompanha nas redes sociais sabe que já fiz inúmeras ressalvas ao Olavo de Carvalho. Sempre que eu publicava uma ressalva, os seus admiradores vinham colocar a minha postagem em xeque. Para aqueles que repetem o mantra “Olavo tem razão”, o óbvio de minhas ponderações sempre passou despercebido. Mas agora a coisa mudou, e uma enxurrada de textos falando mal do “Professor” apareceu na minha timeline. O mais cômico é ver essa postura de quem antes o defendia com unhas e dentes, mesmo quando o mesmo não era atacado, apenas questionado. O que mudou?

O Srº Olavo começou a postar muitas frases e questionamentos em defesa do catolicismo. Até aí tudo bem, ele é católico. O problema foi quando ele disse que os protestantes mataram mais que a Inquisição Católica (cadê as fontes “Professor”?), que a Inquisição é invenção dos protestantes, quando disse que o protestantismo foi concebido por dois filhos da p*t# e quando agrediu a doutrina da predestinação. Logo, nossos pastores começaram a vociferar contra o pensador e, como dizem os pernambucanos, só não o chamaram de arroz doce. Todavia, o que me deixa intrigado é que só agora perceberam que o Olavo de Carvalho é alguém que traz certo prejuízo a cosmovisão reformada. Cegueira? O que a provocou, então?

Tenho arquivado alguns print’s de frases ditas pelo Srº Olavo que são uma afronta ao que nós, do segmento protestante, acreditamos em matéria de fé e de ética. Coletei seus dizeres para referendar um texto que cogitei escrever. Meu objetivo era demonstrar que o Olavo de Carvalho não deveria ser tão recomendado para os nossos jovens, pois, seus ensinos iriam confundir aqueles que ainda não tem uma base solidificada. Tanto é que depoimentos de jovens protestantes que se converteram ao catolicismo e deram graças ao “Professor” são até compartilhados na internet (como este aqui). Desisti do texto devido a um imbróglio entre o próprio Olavo e o Júlio Severo e não quis que as pessoas associassem o meu escrito como sendo partidário de um dos lados desta briga. Agora, também acredito não precisar usar os print’s, pois, todos viram a face do Olavo que teimavam ou não queriam enxergar. Ora, que face é essa?

Antes de mais dada, gostaria de dizer que não me refiro a nenhuma obra literária do Olavo, mas sim a sua atuação na internet, quer nas redes sociais, quer em vídeos no YouTube. A face que nunca admirei e nem recomendei pode ser vista na sua página, recheada de pornofonia. Outra coisa: a imagem que ele tem de si (do seu conhecimento) é extremamente narcisista e seus vídeos que tratam de filosofia possuem um viés que, para os que confessam os credos reformados, não coadunam com o pensamento calvinista. Como disse Schaeffer: “a Reforma repudiou tanto a formulação aristotélica quanto a neoplatônica”[1]. E são exatamente estas formulações que o Olavo utiliza para desenvolver seu raciocínio filosófico. Um vídeo curto de seis minutos mostra a concepção dualista do Olavo, onde ele diz que “a lei moral visa à salvação da alma e não visa a sua conduta neste mundo. O evangelho não ensina como você organizar a sociedade, como que se deve ter uma sociedade mais produtiva, uma sociedade justa...não! O evangelho está alheio a isso, ele está interessado na salvação da sua alma meu filho”[2]. Recorro a Schaeffer mais uma vez para mostrar que esta posição é equivocada:

A verdadeira espiritualidade abrange toda a realidade. Há coisas que a Bíblia nos mostra como pecaminosas – as quais não estão de acordo com o caráter de Deus. Mas, tirando isso, o senhorio de Cristo toda a vida e toda a vida igualmente. Isto é, a verdadeira espiritualidade abrange não somente toda a vida, mas abrange todas as partes do espectro da vida igualmente. Neste sentido, não há nada na nossa realidade que não seja espiritual.[3]
Muito diferente era, e é a perspectiva bíblica sustentada pela Reforma. Não é uma concepção platônica. A alma não é mais importante que o corpo. Deus criou o homem no seu todo e o homem todo é importante. A doutrina da ressurreição corpórea dos mortos não é coisa superada, anacrônica. Ela nos diz que Deus ama o homem todo e que o ser humano é importante em sua totalidade. Portanto, o ensino bíblico se opõe ao platônico, segundo o qual a alma (o “superior”) é muito importante enquanto que o corpo (o “inferior”) fica com bem reduzida importância. A concepção bíblica opõe-se de igual modo à posição humanista em que o corpo e a mente autônoma assumem grande relevância mas a graça se faz praticamente destituída de significação.[4]

Até aqui pode parecer bobagem tudo isso, pois, por não ser protestante, obviamente que o Olavo não teria que afinar suas ideias com o calvinismo em sua totalidade. Evidente que não! Contudo, diante de toda a recomendação não filtrada feita por pastores e teólogos às obras dele, muitas destas recomendações recheadas de entusiasmo, e que concediam um status quo de mito para o Olavo, acabaram por seduzir muitos jovens despreparados para a idolatria. Quando falo sobre idolatria não me refiro a voltarem à devoção aos santos praticada pelos romanistas, pois, não foram todos que se tornaram católicos ao ouvirem o “Professor”, falo de idolatrarem a pessoa do Olavo, isso tudo por terem uma visão não amadurecida tanto da fé como da política.


A maioria das pessoas conhecem o Olavo de Carvalho da internet e sua atuação contra o marxismo, principalmente seu posicionamento anti-petismo. Essa afinidade fez com que muitos não atentassem para as outras questões supra elencadas. O equívoco dos protestantes é achar que “o inimigo do meu inimigo é meu amigo”. O fato do Olavo falar muitas verdades sobre as demandas diabólicas do marxismo não deveria fazer dele um pensador de referência para os cristãos reformados. Afinal, temos ou não temos bons pensadores e teóricos políticos dentro da tradição calvinista? Claro que temos, mas vivemos carentes de referências mais “famosas”, digamos assim. Vejo reformados publicando diversos vídeos de criaturas como o Silas Malafaia, que é herege de primeira categoria. Geralmente a saída para este comportamento é uma frase que assim diz: “Não concordo com a teologia do Malafaia, mas estou com ele no posicionamento político”. Por mais que ele tenha dito coisas corretas contra o Governo e os militantes esquerdistas, ele não deixa de ser um corruptor da Escritura Sagrada, assim sendo, não deveríamos associar a sua imagem a nossa. Com o Olavo não pode ser diferente. Se ele, ou outro, diz algo que seja verdadeiro, isso não é o suficiente para que eu compartilhe suas falas. Nós mesmos poderíamos dizer o que tais homens dizem em sua essência - se assim cremos - sem ter que remeter a nossa imagem com personas que não são espelhos da piedade cristã. Lembrando que uma vida piedosa é uma evidência dos eleitos, que são chamados para as boas obras.

Sempre quando via pastores e outros cristãos reformados compartilhando vídeos e frases contendo palavrões (sem levar em conta a questão do decoro) apenas por ter sido uma fala que politicamente se alinhava com a sua, meu coração doía. Mais dorido ainda era ver nossos jovens, que infelizmente não leem homens como Schaeffer, Kuyper, Dooyeweed, para solidificar sua cosmovisão reformada, sendo doutrinados pelo Srº Olavo, que por mais conservador que seja – politicamente falando – não é nem de longe um bom referencial. Podemos dizer que o Olavo de Carvalho teve e tem sua relevância política, e que as suas obras não precisam ser (de um todo) rechaçadas. Mas, apelo aos pastores que aprendam a lição e filtrem suas recomendações às suas ovelhas. Não esqueçam que ensiná-las a cosmovisão abrangente do calvinismo é um dever ministerial. Negligenciar isto e ficar recomendando pensadores X ou Y sem as devidas ressalvas pode causar um estrago pior do que se imagina. Que isso tudo nos sirva de lição! 

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Notas:
[1] A Morte da Razão, p. 15.
[2] https://www.youtube.com/watch?v=hKOCtCgn2-I
[3] A Igreja no século 21, p.233.
[4] A Morte da Razão, p. 13. 

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Autor: Thiago Oliveira
Fonte: Electus
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